quinta-feira, março 06, 2008

Metade


A chama da vela ilumina metade da cama. Uma imagem, a lembrança de uma escada e de um celular. Um som que eu não posso esquecer, o ranger dos degraus; risos abafados, quase uma fuga, mãos dadas e um único destino: um quarto escuro e a leve sensação de proteção. Num momento onde eu fiz do passado uma promessa, um relicário dessa paixão quase esquecida, morta, me alimentando. O cheiro de cravo pelo quarto e a sensação do seu cabelo molhado tocando a minha pele quente. Menta americana, o gosto, num contato infantil, no colo vazio, nas entrelinhas o retrato dessa saudade em preto e branco. Mentiras, traições momentâneas e a falta... Tantos lugares, o espaço ocupado por rostos estranhos, um medo... A trilha sonora de noites extasiantes, das quais ainda tenho a ansiedade, a espera, o apuro, outro medo. O suspiro, o calor, tanto espaço e o sono não vem. O sonho, o apêlo, mais um medo. O medo que nos torna incapazes e frios, estáticos diante da vida. A mágoa que vai e vem como o vento. A mágoa que não cessa, dói e queima o tempo todo. Momentos... No nosso ritmo eu me encontro e me refaço, por segundos chega a machucar mas depois, a sensação dessa história sem fim. Te prendo, te impeço, te amo. Essa chama que não se apaga, a crença, a superstição. A música que toca a culpa. Um instrumento de tortura, a caneta quase não tocando o papel; as palavras velam teu sono ou o teu cansaço... Meu quarto, minha ansiedade, seu tédio, nosso passado. Foge, corre pra longe e me refaz, seu pecado. Vem, sente esse gosto e eu te mostro do que sou capaz.

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